Ferro. Este elemento provavelmente é conhecido por todas as pessoas no planeta por ser peça fundamental na história humana, seja em manuscritos alquímicos, na idade histórica homônima ou na industrialização da sociedade moderna. Além disso, é um dos elementos mais abundantes do planeta (juntamente ao silício e ao oxigênio) e, por isso, é de suma importância nos processos geológicos, não somente no campo econômico, mas em variados campos da geologia, inclusive na astronomia.
Composição da Terra
Figura 1: Composição química da Terra comparada com a da crosta, ilustrando a diferenciação geoquímica. Fonte: USP. Acesso em 24/07/2021.
A Terra possui uma abundante quantidade de ferro (de símbolo atômico Fe) em sua composição, especialmente quando tratamos de valores absolutos. Isto se deve à composição do núcleo do planeta, composto por uma liga de Fe-Ni cujo raio total é de aproximadamente 3400 Km; pelo manto peridotítico (de minerais ferromagnesianos) e por concentrações na crosta, que, juntos, compõe cerca de 33% do planeta. Porém, este material está em profundidades extremamente elevadas e sob temperaturas de até 6000ºC. Já sua concentração na crosta é bastante inferior ao total, ainda que também em grandes quantidades, perfazendo 6% da crosta terrestre. Esse fato é peça chave para que tenhamos quantidades significativas de Fe economicamente explotável.
Depósitos minerais
Devido à sua quantidade, existem diversos tipos de depósitos conhecidos, cada um deles relacionados a processos tectonomagmáticos, vulcanossedimentares, biológicos, hidrotermais ou de alteração. Os tipos mais importantes são:
FFBs
Figura 2: FFB em Karijini National Park, Western Australia. Créditos: Graeme Churchard. CC. Acesso em 24/07/2021.
O principal tipo de depósito de ferro em termos econômicos são as FFBs, acrônimo para Formações Ferríferas Bandadas. São compostas por rochas sedimentares químicas tipicamente bandadas ou laminadas, contendo 15% ou mais de ferro de origem sedimentar (James, 1954).
Existem 3 diferentes gêneses para uma FFB, dos tipos: Algoma, Lago-Superior e Rapitan. Para saber mais, leia nosso texto sobre Formações Ferríferas Bandadas.
Figura 3: Gráfico de pressão parcial de O2 pelo tempo em Ga, apresentando as concentrações de FFBs ao longo do tempo geológico. Fonte: Codemge. Acesso em 24/07/2021.
Além disso, processos tectônicos ocorridos nas FFBs podem ocasionar a formação de itabiritos. Estas, por passarem por processos de enriquecimento relativo, podem ser hospedeiras de depósitos naturalmente enriquecidos de ferro, como ocorre nas rochas da cidade mineira homônima, na região da Província Mineral do Quadrilátero Ferrífero.
Depósitos Lateríticos (ou de alteração supergênica)
Figura 4: Mineração manual de lateritos para confecção de tijolos em Angadipuram, India. Créditos: Werner Schellmann. CC. Acesso em 24/07/2021.
Depósitos desse tipo são formados pelo enriquecimento relativo de rochas com minerais de Fe, Mn e Al (estes bastante imóveis). Exemplos são hematita, magnetita e goethita que, após passarem por processos de alteração superficial, que lixivia os minerais menos resistentes, como feldspatos, quartzo, carbonatos e micas, ficam preservados apenas os oxi-hidróxidos de ferro, gerando rochas conhecidas como canga (abreviação do tupi-guarani tapuyuna-acanga, de corruptela itapanhoacanga ou pedra cabeça de negro, (COMMONS, 2020)).
Essas rochas possuem uma alta resistência ao intemperismo e, dessa forma, preservam os relevos mais altos onde ocorrem, além de não permitirem o afloramento de vegetação mais esparsa. Por tais razões, as províncias ferríferas mais importantes do Brasil, Quadrilátero Ferrífero e Carajás-Tapajós se mantiveram bem preservadas ao longo do tempo e puderam ser descobertas. No caso de Carajás, o fato da vegetação ter formado uma clareira sobre essas rochas permitiu aos geólogos sua descoberta entre a densa vegetação amazônica, fato que deu início à mineração de Serra-Pelada.
Para que ocorra o enriquecimento desse material, são necessários vários ciclos de fluxo d’água que as torna aquíferos confinados, seguido de rebaixamento do aquífero até que estejam na zona vadosa. Dessa forma, os minerais primários e secundários de Fe, Mn e Al permanecem e se tornam o produto principal das cangas, formando os depósitos lateríticos. Para saber mais, leia nosso texto sobre Depósitos Supergênicos.
Depósitos Oolíticos de Ferro ou Ironstones
Figura 5: Ironstone da Formação Mississippian Breathitt , Kentucky, EUA..
Estes depósitos são formados por oóides (clastos com formato arredondado e de granulometria de tamanho areia de estrutura concêntrica) de diversos minerais de ferro agrupados em uma matriz rochosa férrica. Segundo MgGregor e Wells (apud Petrànek e Van Houten, 1997), os ironstones são distintas rochas sedimentares não cherticas, siliciclásticas arenosas a argilosas ou carbonáticas com mais de 50% de oóides ferruginosos ou mais de 15% de ferro.
Os períodos de formação desses depósitos se concentraram durante o Ordoviciano-Siluriano até o Devoniano, enquanto seus ambientes genéticos perfizeram plataformas continentais, especialmente em regiões marinhas rasas. Porém, as opiniões científicas divergem quanto à fonte de materiais que se acumularam nos oóides, pois, enquanto alguns pesquisadores defendem origens magmáticas dos materiais que formam os minerais de ferro, outros apontam que o aporte sedimentar nas bacias já permite condições para formação desses depósitos.
De toda forma, os ironstones só foram explotados economicamente sob condições desfavoráveis à mineração em outros tipos de depósitos, como já ocorreu na Grã-Bretanha, dada sua limitada ocorrência ao redor do planeta.
Depósitos associados a magmatismo extrusivo
Podemos dividir esse tipo de depósito em dois. O primeiro, chamado tipo Kiruna, é classificado a partir da relação ao magmatismo cálcio-alcalino e, por isso, supõe-se que ocorra a partir da diferenciação magmática de intrusões plutônicas. Esses depósitos ocorrem como corpos podiformes maciços, por vezes submaciços, tabulares ou em diques, contendo magnetita e apatita como minerais maiores, além de outros acessórios. Seus ambientes tectônicos se concentram em arcos continentais (tipo andino) e Greenstone Belts. Além disso, sua gênese remonta do Proterozóico ao recente.
O segundo tipo, Lahn-Dill, formaram-se durante o Devoniano e Carbonífero, sendo corpos de minério hematíticos desenvolvidos sobre centros de extrusão magmática. Por vezes, chegam a conter os depósitos mais concentrados em ferro conhecidos atualmente, apesar de sua ocorrência ser bastante localizada em pequenos horizontes estratigráficos singenéticos à extrusão de lavas. De toda forma, somando-se as ocorrências nos distritos que as englobam, suas reservas minerais podem atingir até 100 Mt.
Depósitos Escarníticos (Skarn ou de metamorfismo de contato)
Em linhas gerais, os skarns ocorrem quando há metamorfismo termal em uma rocha carbonática em contato com rochas ricas em silício pela ação de uma intrusão magmática. Mais especificamente, sua ocorrência margeia intrusões formadoras de depósitos porfiríticos de cobre quando as intrusões entram em contato com rochas carbonáticas precipitadas ou sedimentadas em bacias. Também foram evidenciados skarns ao longo de sistemas de falhas e zonas de cisalhamento, no assoalho oceânico e em terrenos metamórficos de baixas profundidades crustais, indicando, portanto, que nem plutons nem carbonatos são estritamente necessários para a formação de skarns.
Tais depósitos podem também formar concentrações de Au, Cu, Zn, W, Sn e Mo e, dessa forma, é classificado em sete classes diferentes. No caso do Fe-skarn, podem ser retirados, juntamente ao metal que o nomeia, concentrações econômicas de Cu, Co, Ni e Au.
Há de ressaltar, também, que existe uma diferença entre depósitos escarníticos e escarnitos metamórficos, mesmo que ambos estejam intimamente relacionados. A diferença principal entre eles depende dos processos formadores de depósitos econômicos, isto é, um skarn econômico depende de processos hidrotermais que concentram minério em zonas de fraturas, falhas e brechas a partir de skarns metamórficos, podendo ocorrer em diversos tipos de rochas, dada sua gênese intrusiva que atravessa as camadas sobrejacentes ao pluton.
Autor
Lucas de Pádua Ribeiro
Referências
Caxito, Fabrício; Dias, Tatiana. Ferro. recursomineralmg.codemge.com.br. Belo Horizonte. 2018. Disponível em http://recursomineralmg.codemge.com.br/substancias-minerais/ferro/
COMMONS, W. File:Laterite quarry, Angadipuram, India. C 004.jpg — Wikimedia Commons, the free media repository, 2020. Disponível em: <https://commons.wikimedia.org/w/index.php?title=File:Laterite_quarry,_Angadipuram,_India._C_004.jpg&oldid=463802479>
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McGregor, F., Ramanaidou, E., & Wells, M. (2010). Phanerozoic ooidal ironstone deposits – generation of potential exploration targets. Applied Earth Science, 119(1), 60–64. doi:10.1179/037174510x12853354810660
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